A menina estava sozinha, sem seus brinquedos, ansiando por alguém.
O menino era ainda mais só. As mãos fortes esfarelavam o que desejasse.
Se conheceram, e na praia, deram um mergulho fundo, e algumas tragadas de ar.
A vida berrou-lhes nos ouvidos, dos quais escorria uma aquecida água do mar.
Mas logo haveria de calar-se, pois os calados eram ainda mais profundos que o mar.
O novo capitão, para passar melhor o tempo, esmerou-se na construção de um boneco. Expirou-lhe o espírito. Tornou-se ventríloco.
Antes mesmo de partir, testou a fala. Soava real. Até para si mesmo.
Buscou o Oriente e suas maravilhas. Encontrou uma de cabelos dourados. O espírito hesitou pois já não reconhecia bem a casa.
Partiu, pois o mundo lhe chamava. Mas nenhum porto o contentava. Rezou por ajuda.
- Sim, respondeu-lhe a silhueta de um fantasma espelhada na água: menos luz vai te fazer bem.
- Por que não? pensou o boneco. Mas mandou o ventríloquo em seu lugar.
Viveu algumas aventuras, mas tempos depois, num dia distraído, saltou-lhe por cima seu senhor, dominou-o, e sem explicar, deu-lhe o mesmo remédio.
Saído assim rápido da penumbra, seus olhos se incandesceram. O sol beijou-lhe a boca salgada e lambeu-lhe o pescoço forte. Parecia que não anoiteceria mais.
Num dia de outono porém, anunciou-se uma penumbra, envolveu-lhe e ao navio, por sobre ela vinha o boneco, trazendo uma mordaça de ferro dourado na qual pode ver horrorizado o seu nome escrito. Imobilizado. O boneco colocou-lhe no colo, e pôs-se a falar por ele. E por onde passava, era aclamado pelo seu engenho.
Um mal destino se desenhava, mas em suas navegações tinham se aproximado demais do Pólo Norte, e o magnetismo mostrou-se intenso, extenuante, implacável, e a velha mordaça cedeu.
Quem diria que justamente por estas frestas pudesse entrar algo tão suave. Era um veneno ou era um remédio?
Dependia da dose, claro. E acima não foi um bom negócio...
Acabou por matar o boneco.
Nenhum comentário:
Postar um comentário